terça-feira, 10 de maio de 2011

Parte III - A Cidade do Sol

 No trajeto de volta para casa, apoiada em Mariam, Laila podia ouvir os gritos apavorados da filha. Revia nitidamente a cena: as mãos grandes e calosas de Zaman segurando a menina pelos braços, puxando-a, a princípio com brandura, depois, com mais vigor, e, finalmente, com força, para fazê-la soltar a mãe. Via Aziza, nos braços do diretor, dando chutes e pontapés, enquanto ele a levava às pressas para algum lugar; e ouvia a menina gritar como se fosse desaparecer da face da terra. E via a si mesma, correndo pelo corredor, de cabeça baixa, com um berro lhe subindo pela garganta.
 — Sinto o cheiro dela — disse a Mariam quando já estavam em casa. Seus olhos fitavam o vazio, por sobre os ombros de Mariam, para além do quintal, dos muros, na direção das montanhas, escuras como uma cusparada de tabaco. — Sinto o cheiro dela dormindo. Você também sente? Sente o cheiro dela?